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AUTISMO E SEXUALIDADE: ORIENTAÇÕES PARA EDUCAÇÃO SEXUAL DE ADOLESCENTES AUTISTAS.

Como os pais podem orientar o adolescente autista sobre a sexualidade? É possível? Sim! É possível e fundamental! Os adolescentes autistas experimentam as mesmas transformações no corpo que os adolescentes neurotípicos pois seus hormônios estão presentes e provocam excitação. Com o despertar do interesse sexual dos adolescentes torna-se mais difícil a tarefa de educar. Todavia os pais devem apoiá-los e incentivá-los a buscarem sua independência e autonomia através do aconselhamento e da educação sexual. Cadastre-se e receba gratuitamente em seu e-mail nossos E-books! 

TRANSTORNOS DE PREFERÊNCIA SEXUAL, IMPULSO SEXUAL EXCESSIVO E TRANSTORNO DE IDENTIDADE SEXUAL: ABORDAGEM CLÍNICA, CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS E DIRETRIZES DO TRATAMENTO.

Por Mirian Lopes

1. Definições e classificações

Os transtornos de preferência sexual ou parafilias são caracterizados por impulsos sexuais intensos e recorrentes, fantasias sexuais específicas repetitivas e persistentes, exclusivamente em resposta a objetos ou situações incomuns, ou seja, preferência por parceiro sexual que não seja humano, adulto e vivo e cuja finalidade não seja excitação sexual ou procriação.1

De acordo com a 10ª revisão da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10)2, estes transtornos podem ser assim classificados:

F65      Transtorno de Preferência Sexual
F65.0   Fetichismo
F65.1   Travestismo Fetichista
             Fetichismo com Travestismo
F65.2    Exibicionismo
F65.3    Voyeurismo
F65.4    Pedofilia
F65.5    Sadomasoquismo
             Masoquismo
             Sadismo
F65.6    Transtornos Múltiplos de Preferência Sexual
             (Fetichismo, Travestismo e Sadomasoquismo)
F65.8    Outros Transtornos da Preferência Sexual
F65.9    Transtorno da Preferência Sexual, não especificado
             Desvio Sexual sem outra especificação
No Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, 4ª edição, texto revisado (DSM-IV-TR)3, estes transtornos estão assim classificados:
Parafilias
302.4    Exibicionismo
302.81  Fetichismo
302.89  Frotteurismo
302.2    Pedofilia
302.83  Masoquismo Sexual
302.84  Sadismo Sexual
302.3    Travestismo Fetichista
302.82  Voyeurismo
302.9    Parafilia sem outra especificação
No Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, 5ª edição (DSM-V), ocorreram algumas mudanças de nomenclaturas para estes transtornos, conforme apresentado por Zucher4: Distúrbio Voyeurista, Distúrbio Exibicionista, Distúrbio Frotteurista, Distúrbio do Masoquismo Sexual, Distúrbio do Sadismo Sexual, Distúrbio Fetichista, Distúrbio Transvestico, Distúrbio Pedofilico, Outros Distúrbios Parafílicos Especificados, Distúrbios Parafílicos não especificados.
O impulso sexual excessivo é caracterizado pela falta de controle dos impulsos,  resultando em incapacidade de resistir à tentação de realizar atos sexuais, o que causa tensão crescente antes da realização de tais atos, seguida de prazer, gratificação ou alivio pela execução destes atos.1

A 10ª revisão da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10)2, define como, F52.7 Apetite sexual excessivo, e inclui ninfomania e satiríase.

No Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, 4ª edição, texto revisado (DSM-IV-TR)3 está destacado entre os 302.9 Transtornos Sexuais Sem Outra Especificação, a seguinte característica: “sofrimento acerca de um padrão de relacionamentos sexuais repetidos, envolvendo uma sucessão de parceiros sexuais sentidos pelo individuo como coisas a serem usadas”(p.553).
Na literatura científica é possível encontrar as seguintes denominações para o impulso sexual excessivo: compulsão sexual, hipersexualidade, vicio sexual, comportamento sexual compulsivo entre outros termos.
Também são apresentados critérios para definição de compulsão sexual, sendo estes classificados em seus aspectos, em uma sequência de fases nos episódios de busca de sexo: a) fissura – o individuo fica absorto em pensamentos sobre sexo, como num transe, com frequentes relatos de experiências dissociativas. Predominam as ideias acerca de objetos sexualmente estimulantes; b) ritualização – desenvolve uma rotina sexual com excitação
crescente; c) gratificação sexual – torna-se incapaz de cessar o processo antes de se satisfazer, ficando alheio a estímulos ambientais adversos que o detenham antes da finalização do ato sexual; d) desespero – pela impotência e, muitas vezes, pelo remorso.1

O transtorno de identidade sexual ou transtorno de identidade de gênero é caracterizado pelo desejo irreversível de viver e ser aceito como pertencendo ao sexo oposto, acompanhado por sentimento persistente de grande desconforto e de inadequação em relação ao seu próprio sexo anatômico, causando sofrimento significativo ou prejuízo do funcionamento social ou ocupacional ou em áreas importantes da vida do individuo.1

De acordo com a 10ª revisão da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10)2, este transtorno pode ser assim classificado:

F64     Transtorno de identidade sexual
F64.0  Transexualismo
F64.1  Travestismo de duplo papel
       Transtorno de identidade sexual no adulto ou adolescente, tipo não transexual          
F64.2   Transtorno de identidade sexual na infância
F64.8   Outros transtornos da identidade sexual
F64.9   Transtorno do papel sexual sem outra especificação
No Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, 4ª edição, texto revisado (DSM-IV-TR)3  este transtorno esta assim classificado:
Transtornos da identidade de gênero
302.xx  Transtorno da identidade de gênero
302.6    Em crianças
302.85  Em adolescentes ou adultos         
            Especificar-se (para indivíduos sexualmente maduros):
            Atração sexual pelo sexo masculino
            Atração sexual pelo sexo feminino
            Atração sexual por ambos os sexos
            Ausência de atração sexual por qualquer dos sexos
302.6  Transtorno da identidade de gênero sem outra especificação
302.9  Transtorno sexual sem outra especificação
No Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, 5ª edição (DSM-V), também ocorreram mudanças de nomenclatura em relação a este transtorno, conforme apresentado por Zucher4: Disforia de Gênero, Outra Disforia de Gênero Especificada e Disforia de Gênero Não-Especificada.

2. Prevalência

De acordo com Abdo1, estima-se que o transtorno de preferência sexual ocorra em 1% da população, com predominância masculina numa proporção de 20 homens para cada mulher, tendo início antes dos 18 anos de idade, sendo comuns três a cinco parafilias concomitantes ou alternadas durante a vida do parafílico. O transtorno mais relatado é a pedofilia. E os mais frequentes na literatura médica e leiga são o exibicionismo e o voyeurismo, quando ocorrem flagrante e apreensão.  

Quanto ao impulso sexual excessivo, de acordo com Kuzma e Black5, estima-se que  ocorra em 3%  a  6% da população adulta nos Estados Unidos, constituído por 80% masculinos auto-identificados individualmente com comportamento de compulsão sexual, de acordo com Kaplan e Krueger.6

De acordo com Abdo1, os dados do transtorno de identidade de gênero são controversos. Nos Estados Unidos, com base em registros relativos ao tratamento para redesignação sexual,  estimava-se nos anos de 1960, a relação de 1 transexual masculino para cada 30.000 homens e 1 transexual feminina para cada 100.000 mulheres. Na Europa, com base em pesquisas conduzidas na década de 1990 e em 2003, estimava-se 1 transexual masculino para cada 11.900 homens e 1 transexual feminina para cada 33.800 mulheres; e 1 transexual masculino para cada 12.800 homens e 1 transexual feminina para cada 52.100 mulheres. No Brasil estima-se 1 transexual masculino para cada 40.000 homens e 1 transexual feminina para cada 80.000 mulheres. Em relação ao transtorno dessa natureza na infância estima-se de 1%  a  2% da população infantil, sendo de 5:1 a relação entre meninos e meninas.

3.  Etiologia

De acordo com Abdo1, os fatores etiológicos do transtorno de preferência sexual são insuficientemente conhecidos. Há hipóteses de que pertençam ao espectro dos transtornos obsessivo-compulsivos ou resultem de experiências sexuais precoces com adultos  ou de bloqueio/regressão no desenvolvimento sexual. 

Quanto ao impulso sexual excessivo pode decorrer da tendência a aliviar a dor, de abuso infantil ou negligência. Constrangimento, autoestima negativa e sentimentos de inferioridade podem provocar relacionamentos disfuncionais que acompanhados por dor e angústia, conduziriam à busca de algum elemento com qualidades analgésicas, originando a compulsão (por bebidas alcoólicas, drogas, alimentos, jogo, trabalho ou sexo). 1  

De acordo com Kaplan e Krueger6 a etiologia da hipersexualidade é desconhecida. Esta pode ser neurobiológica, pois associa-se a condições médicas como demência, onde os danos frontal e cortical estão associados com desinibição e o lobo temporal danificado esta associado com a hipersexualidade. Também o abuso de substâncias incluindo metanfetamina e cocaína tem sido relatados com a hipersexualidade, bem como, tratamentos dopaminérgicos para doença de Parkinson.

Quanto a etiologia do transtorno de identidade de gênero requer mais estudos. Atualmente há duas linhas de pesquisas organicistas que tentam explicar sua origem: a que estuda a influência dos hormônios sexuais na diferenciação cerebral  e a que especula sobre as alterações genéticas (cromossômicas). 1

4.  Abordagem clínica

4.1 Diagnóstico

De acordo com Abdo1, o diagnóstico para transtorno de preferência sexual deve investigar a presença de fantasias, anseios sexuais ou comportamentos recorrentes intensos e sexualmente excitantes envolvendo objetos e não seres humanos, crianças ou adultos. Deve-se considerar o tempo de duração maior que seis meses, a presença de sofrimento e as dificuldades interpessoais decorrentes.

No diagnóstico do impulso sexual excessivo, causas orgânicas devem ser consideradas e comorbidades tais como depressão e ansiedade. Deve ser realizada entrevista para compreensão clinica, considerando-se aspectos como, a história  psicossocial, a saúde mental e psiquiátrica, a história de uso de substancias e a historia medica do paciente.

Também devem ser utilizados questionários para pesquisar a propensão para inibição ou excitação sexual e os instrumentos como as Escalas para Excitação Sexual e para Inibição Sexual, que avaliarão o direcionamento sexual do paciente.6  Além disso, Abdo1 afirma é necessário o diagnóstico diferencial com transtornos de preferência sexual, pois a compulsão sexual pode vir associada a comportamentos parafílicos.

Quanto ao transtorno de identidade de gênero é diagnosticado conforme critérios definidos pela CID-10 e pelo DSM-IV-TR, e a hipótese vai se consolidando ao longo do acompanhamento do paciente.

Ele é baseado no autorrelato do paciente, através de várias entrevistas clínicas para obter informações sobre o desenvolvimento psicossexual, a identificação de gênero, a orientação sexual e os sentimentos sobre suas características secundárias e o papel social de seu sexo designado. Também é necessário um mínimo de dois anos de presença do quadro para que se possa concluir este diagnóstico.1

4.2 Tratamento
De acordo com Abdo1, o tratamento para transtornos de preferência sexual baseia-se em psicoterapia associada a medicamentos, tais como antidepressivos e neurolépticos em doses crescentes até o controle da sintomatologia. Além disso, é essencial incentivar a motivação do paciente para que os resultados do tratamento sejam alcançados.
Magalhães MLC7 et al afirma que para o tratamento da pedofilia além da psicoterapia de longa duração, existem três classes de drogas comumente utilizadas:  a) hormônios femininos, em especial o acetato de medroxiprogesterona; b) agonistas do LHRH (hormônio liberador de hormônio luteinizante), como a triptorelina, o acetato de goserelina e a acetato de leuprolide; c) antiandrogênios, que bloqueiam a captação e o metabolismo da testosterona e reduzem os níveis sanguíneos desse hormônio, os quais têm sido muito eficazes na redução da taxa de recidiva. A castração cirúrgica é também oferecida em algumas circunstâncias  para pedófilos que costumam serem ofensores repetitivamente. 
De acordo com Kaplan e Krueger6 sendo a hipersexualidade um distúrbio complexo, muitos clínicos recomendam uma aproximação multifacetada para o tratamento,  incluindo várias modalidades, tais como, terapia cognitivo comportamental psicoterapia psicodinâmica, tratamento psicofarmacológico, terapia individual ou em grupo e terapia de casal, as quais deverão ser realizadas com a avaliação da  necessidade especifica para cada paciente.
De acordo com Lara et al8 o tratamento para o transtorno de identidade de gênero, especificamente do transexualismo, no Brasil, foi autorizado pela Resolução 1.482/97 (e atualizada pela Resolução CFM nº 1.955/2010)9, que prevê a avaliação do paciente por equipe multidisciplinar composta por: psiquiatra, psicólogo, assistente social, endocrinologista e cirurgião, a qual é responsável pela formulação diagnóstica, avaliação
psiquiátrica,  apoio psicológico e psicoterapia,  administração/correção do uso de hormônios,  avaliações de condições familiares e sociais, preparação para a cirurgia, ato cirúrgico e acompanhamentos pós-operatórios (a curto e longo prazos). A terapia hormonal (TH) deve anteceder a cirurgia de redesignação sexual, de modo a propiciar a aquisição de caracteres sexuais secundários relativos ao sexo almejado.
5 Conclusões

Os transtornos de preferência sexual ou parafilias,  o impulso sexual excessivo e o transtorno de identidade sexual ou transtorno de identidade de gênero causam  sofrimento significativo ou prejuízo do funcionamento social ou ocupacional ou em áreas importantes da vida do individuo, e é necessário que continuem a serem estudados para melhor compreensão de sua abordagem clínica.

O adequado diagnóstico destes quadros é extremamente importante, pois estabelece um foco para o tratamento e interfere na qualidade de vida dos pacientes. A cuidadosa observação e avaliação do paciente e a disponibilidade de equipe multidisciplinar podem auxiliar na identificação da causa de muitos conflitos psíquicos e relacionais.

O tratamento deve ser baseado na perspectiva do paciente de acordo com suas necessidades e possibilidades. Este é baseado em psicoterapia associada a medicamentos, tais como antidepressivos e neurolépticos, e terapia hormonal. Em alguns casos, os medicamentos são administrados em doses crescentes até o controle da sintomatologia.  

Além disso, a participação de equipe multidisciplinar composta por psiquiatra, psicólogo, assistente social, endocrinologista e cirurgião é importante e  deve  incluir várias modalidades, tais como, terapia cognitivo comportamental psicoterapia psicodinâmica, tratamento psicofarmacológico, terapia individual ou em grupo e terapia de casal, as quais deverão ser realizadas com a avaliação da  necessidade especifica para cada paciente.  É essencial incentivar a motivação do paciente para que os resultados do tratamento sejam alcançados.

O profissional de saúde deve acolher o paciente estabelecendo o vínculo e a partir de uma abordagem holística estar atento para a intervenção psicoeducativa, indicações psicoterapêuticas ou outros procedimentos adequados nos fatores de risco, para o estabelecimento de um tratamento eficaz deste transtornos.

6 Referências

1.      Abdo CHN. Sexualidade humana e seus transtornos. São Paulo: Casa Leitura Médica, 2010.

2.      Organização Mundial da Saúde (OMS). Classificação estatística internacional de doenças e problemas relacionados à saúde. Texto revisado (CID-10). Tradução Centro colaborador da OMS para a família classificações internacionais em português. 10ªed. São Paulo: Edusp, 2011.

3.      Associação Psiquiatrica Americana (APA). Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. Texto revisado (DSM-IV-TR). Tradução Cláudia Dornelles 4ª ed. Porto Alegre: Artmed, 2002.

4.      Zucker KJ. DSM-5: call for commentaries on gender dysphoria, sexual dysfunctions, and paraphilic disorders. Arch. Sex. Behav. 2013; 42 (1):669–674. Disponível em: <http://link.springer.com/article/10.1007/s10508-013-0148-3>. Acesso em 11 Out. 2013.

5.      Kuzma JM, Black DW. Epidemiology, prevalence, and natural history of  compulsive sexual behavior. Psychiatr Clin North Am. 2008, 31(4): 603–611. Disponível em: <http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0193953X080 0072 5>. Acesso em 10 Out. 2013.
6.        Kaplan MS, Krueger RB. Diagnosis, assessment, and treatment of hypersexuality.  J. Sex. Res. 2010; 47(2-3):181–198. Disponível em: <http://www.tandfonline.com /doi/abs/10.1080/00224491003592863#.UlcXVhAvyZE>. Acesso em 10 Out. 2013.

7.        Magalhães MLC, Reis JTL, Valente PV, Itaborahy PP, Aguiar GLN. Pedofilia: Informações Médico-Legais  para o profissional da saúde. Femina. 2011; 39(2): 85-90. Disponível em: <http://bases.bireme.br/cgi-bin/wxislind.exe/iah/online/?IsisScript =iah/iah.xis&src=google&base=LILACS&lang=p&nextAction=lnk&exprSearch=604885&indexSearch=ID>. Acesso em 11 Out. 2013.
8.        Lara LAS,  Abdo CHN, Romão APS. Transtornos da identidade de gênero:  o que o ginecologista precisa saber  sobre transexualismo. Rev. Bras. Ginecol. Obstet. 2013; 35(6):239-42. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0100-7203 2013000600001&script=sci_arttext>. Acesso em: 11 Out. 2013.
9.        Conselho Federal de Medicina. Resolução CFM n. 1.955, de 3 de setembro de 2010. Dispõe sobre a cirurgia de transgenitalismo e revoga a Resolução CFM nº 1.652/02. Diário Oficial da União, Brasília (DF) 2010 set. 3; Sec.1:109-10.



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