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AUTISMO E SEXUALIDADE: ORIENTAÇÕES PARA EDUCAÇÃO SEXUAL DE ADOLESCENTES AUTISTAS.

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PSICOLOGIA SÓCIO-HISTÓRICA: SUBJETIVIDADE E MUNDO SOCIAL

INTRODUÇÃO

A Psicologia Sócio-Histórica é uma vertente teórica da Psicologia, cujas proposições ligadas ao conhecimento do homem e sua subjetividade estão guiadas pela concepção materialista dialética. Ela surge no inicio do século XX, na União Soviética, momento em que esta procurava reconstruir suas teorias científicas a partir do referencial marxista. Os autores que definem os fundamentos teóricos são: Alexandr Romanovich Luria (1902-1977); Aléxis Nicolaievich Leontiev (1903-1979) e Lev Seminovichi Vigotski (1896-1934).

Vygotski propôs-se a construir uma Psicologia guiada pelos princípios e métodos do materialismo dialético, destinando sua produção à descrição e explicação da construção e desenvolvimento do psiquismo e comportamento humano, a partir das funções psicológicas superiores (pensamento, linguagem e consciência), guiando-se pelo princípio da gênese social da consciência. O humano se constitui pela relação do homem com a realidade, não só enquanto meio social imediato, mas enquanto processo cultural historicamente produzido.

A produção de Vygotski teve continuidade, na União Soviética, com trabalhos de Luria e Leontiev e posteriormente passou a ser estudado em outros paises. Na América Latina, e especificamente no Brasil, sua obra foi adquirindo espaço e se incorporando à área de Psicologia Social. Atualmente, estes conhecimentos expressam diferentes leituras da obra de Vygotsky dentre os diversos grupos que se ocupam da elaboração e construção desta proposta. A denominação Psicologia Sócio-Histórica foi criada pelo grupo da PUC/SP.



1. A CONSTITUIÇÃO DO PSIQUISMO PARA A PSICOLOGIA SÓCIO-HISTÓRICA

Para Luria (1987) é preciso sair dos limites do organismo para explicar as formas mais complexas da vida consciente do homem. Para ele, o objeto da psicologia é o reflexo do mundo externo no mundo interno (a interação do homem com a realidade). A atividade humana caracteriza-se pelo trabalho social mediante a divisão das funções e que origina novas formas de comportamento independente dos motivos biológicos elementares. Os motivos sociais do comportamento surgem devido à atividade social complexa, o trabalho social e a divisão do trabalho.

A linguagem é fator decisivo que determina a passagem da conduta animal à atividade consciente do homem. Esta atividade consciente se distingue radicalmente do comportamento individualmente variável dos animais, pois não esta forçosamente relacionada com motivações biológicas, não está determinada em absoluto, nem por impressões vivas do meio ou pelas contingências da experiência individual direta, mas, está na capacidade de abstração dessa impressão direta. O comportamento humano está baseado no conhecimento da necessidade.

Uma imensa proporção dos conhecimentos e das artes do homem se forma pela assimilação da experiência acumulada do processo da histórica social que se transmite no processo de aprendizagem. Luria pretende explicar as singularidades da atividade consciente humana a partir das distinções do comportamento humano, e aponta duas vias para isto: pela filosofia idealista (dualismo mente/corpo sedimentado por Descartes) e pelo positivismo científico-natural aliado às teses evolucionistas de Darwin (a atividade consciente como fruto da evolução).

A Psicologia Sócio-Histórica apresenta o problema da origem da atividade consciente do homem a partir de posições distintas: as peculiaridades da forma superior de vida do homem devem ser buscadas na conformação sócio-histórica da atividade vital, relacionada ao trabalho social, ao uso de ferramentas e ao aparecimento da linguagem. No homem a atividade adquire um caráter organizado complexo: a satisfação da necessidade passa a ser mediatizada por atos que antecipam o comportamento final e que estão ligados à estrutura da atividade, produzindo com essa forma complexa uma maior atividade consciente (comportamento mediato e imediato).

A reestruturação cardinal do comportamento e a nova estrutura da atividade consciente do homem é constituída, devido o fato de separar da atividade biológica atos especiais não determinados por motivações biológicas diretas, mas dirigidas por um objetivo consciente.

O surgimento da linguagem motiva a formação da estrutura complexa atividade consciente do homem, pois ela se constitui como fator essencial na formação da consciência, criando um mundo de imagens internas. Trata-se de uma construção peculiar que engendra aquilo que convencionamos chamar de subjetividade.

A linguagem permite o processo de abstração, generalização, de análise e classificação que tomou corpo no processo de história social convertendo-a em meio de comunicação e instrumento do pensar que, proporciona o trânsito do reflexo sensorial para a construção do mundo racional. Ela permite ao homem se desligar da experiência direta e garante o nascimento da imaginação, base para a criatividade, além disso, permite a reestruturação das reações emocionais. Os homens se modificam em função do desenvolvimento de suas necessidades e no decurso de sua atividade, suas aptidões, seus conhecimentos e seu saber-fazer cristalizam-se de certa maneira em seus produtos (materiais, intelectuais, ideais).

O processo de apropriação do mundo consiste na aquisição do instrumento (originalmente, instrumento de trabalho), que constrói a função de acumulação (retenção), base para a construção da cultura; e na aquisição da linguagem, processo de apropriação das operações de palavras que são fixadas historicamente nas suas significações. A principal característica do processo de apropriação é de criar no homem nova aptidões, novas funções psíquicas.

O desenvolvimento humano não depende somente de suas características filogenéticas ou ontogenéticas. Este desenvolvimento desembocou na construção das sociedades de classes e na dominação do homem pelo homem, produzindo um campo de desigualdade que vai além dos fatores ambientais – a desigualdade econômica, fruto da divisão social do trabalho e do aparecimento da mercadoria, que irá instrumentar a capacidade criadora do homem.

Uma das principais características da sociedade capitalista é a constituição do individualismo. Entretanto, há uma contradição exposta pela constituição de uma sociedade de massas que produz uma ilusão na qual nos sentimos indivíduos quando somos obrigados a um consumo de massa que nos torna muito parecidos com todos os outros. Mas esta contradição entre individualismo e a massificação é minimizada pelos meios de comunicação de massa, pelas agências socializadoras e pelas agências controladoras, que são responsáveis pela difusão e manutenção de um quadro de valores e crenças que instituem formas de controle e autocontrole.

Uma consciência coletiva distorcida pela presença do quadro de valores e crenças sociais (ideologia) que encobrem os verdadeiros determinantes dessa circunstancia transforma a aparência da diferença social em algo absolutamente normal, e a isto chamamos de constituição da subjetividade capitalista.

Outro fator importante é a forma como se dá a internalização do processo psíquico, pois demonstra claramente que o conteúdo psíquico não tem origem no próprio individuo, mas constitui uma construção social. Assim, o uso de instrumento potencializa a capacidade humana de agir e potencializa a capacidade intelectual. A combinação entre signo e instrumento na atividade psicológica gera a função psicológica superior que ultrapassa o organicamente demarcado. O psiquismo se constitui na relação dialética com a natureza, ou seja, ao mesmo tempo em o homem transforma a natureza, esta também é transformadora do homem.

2. A SUBJETIVIDADE NA PSICOLOGIA SÓCIO-HISTÓRICA

Maffesoli (1995) aponta como as relações sociais no capitalismo tardio transformam a condição subjetiva no plano cultural, qualificada por ele como a emergência de uma modernidade econômico-utilitarista e que está diretamente ligada ao fenômeno do individualismo. A subjetividade é um campo socialmente construído e que se expressa no plano individual (crenças, valores e comportamentos individuais). O termo subjetividade tem sido usado para definir todo o fenômeno humano que escapa a concretude da objetividade, e principalmente no campo da Psicologia e da Psicanálise tem sido utilizado como resultado da produção psíquica (produção do sujeito).

Renato Mezan aponta duas maneiras diferentes para que a idéia de subjetividade seja entendida: como experiência de si e como condensação de uma série de determinações, e por outro lado, como estrutura e como experiência de si depende sobremaneira do lugar social que o individuo ocupa. É no cotidiano do sujeito que a subjetividade tem sua expressão mais palpável (fenômeno socialmente determinado).

González Rey procura demonstrar que o desenvolvimento do psiquismo está intimamente relacionado a sua base material e que, representa um fenômeno específico e não mera reprodução “do mundo externo”. Ele irá considerar a personalidade como fenômeno que se desenvolve controlada por determinantes que atuam fora do campo do sujeito psicológico concreto e a partir de um espaço interativo de distintos níveis de complexidade e de hierarquia no qual o sujeito atualiza permanentemente sua condição social. Ele entenderá a subjetividade como a constituição do psiquismo no sujeito individual.

A subjetividade integra os processos e estados característicos a esse sujeito em cada momento da ação social, momentos inseparáveis do sentido subjetivo que terão para ele. Ela se expressa no plano social como constituinte da vida social e tem base objetiva quando se trata de sua relação com o conhecimento. Ela estaria organizada por processos e configurações que se interpenetram permanentemente e que estão em constante desenvolvimento e vinculados à inserção simultânea do sujeito em outro sistema igualmente complexo, que é a sociedade.

A constituição da subjetividade individual é um processo singular que surge na complexa unidade dialética entre sujeito e meio atual. A constituição subjetiva do real e sua construção por parte do sujeito são processos simultâneos que se inter-relacionam, mas não são dirigidos pela intencionalidade do sujeito.

3. A SUBJETIVIDADE SOCIAL

A discussão da subjetividade social ocorre no campo da construção social da realidade. A realidade é um fenômeno multideterminado e é a expressão do campo dos valores que a interpretam (suas bases subjetivas) e o desenvolvimento concreto das forças produtivas (suas bases objetivas). O individuo é agente ativo de transformação social, independente de ter ou não consciência do fato.

É a partir da consciência de si e da consciência o outro que o plano singular da subjetividade se imbrica com o plano social da subjetividade. È através dessa relação que podemos dizer que é possível para a Psicologia Social enfocar a gênese das representações das construções ideológicas, a partir do estudo da subjetividade social denominada de Dimensões Subjetivas da Realidade. Ela é correlata à Configuração Subjetiva do Sujeito e denota como a subjetividade se configura socialmente. A interação dinâmica, de base objetiva material (os determinantes sociais e econômicos) e campo da configuração subjetiva do sujeito, é o elemento dialético que nos permite considerar a relação dialética entre a produção singular de determinado sujeito e a produção de um conteúdo que representa o repertório cultural de um povo e que se constitui historicamente.

4. CONSCIÊNCIA E ATIVIDADE

O psicológico é a atividade do homem de registrar a experiência e a relação que mantém com o ambiente sociocultural. A capacidade de registrar pode ser denominada de capacidade psíquica. O mundo psicológico enquanto conjunto de registros se constitui a partir das relações que o homem mantêm com seu mundo sociocultural. Assim, cabe à Psicologia compreender o individuo em sua singularidade, internalizando e expressando sua condição histórica e social, sua ideologia e relações vividas.

A consciência deve ser vista como um sistema integrado, numa processualidade permanente, determinada pelas condições sociais e históricas, que num processo de conversão se transformam em produções simbólicas, em construções singulares. A realidade objetiva preexiste e nessa condição passará a fazer parte da subjetividade de um homem em particular.

As funções psicológicas são produto da atividade humana. É através desta atividade externa, que se criam as possibilidades de construção da atividade interna. A atividade de cada indivíduo é determinada pela forma como a sociedade se organiza para o trabalho. Para a Psicologia Sócio-Histórica, o homem é um ser ativo, social e histórico.

A linguagem é o instrumento fundamental nesse processo de constituição do sujeito. Para Vigotsky, as palavras desempenham um papel central no desenvolvimento do pensamento e na evolução histórica da consciência como um todo. A atividade humana é significada como um processo social, mediatizada semioticamente. Assim, a consciência se constitui a partir dos próprios signos, de instrumentos construídos pela cultura e pelos outros, que quando internalizados se tornam instrumentos internos e subjetivos da relação do individuo consigo mesmo.

A palavra é o espaço privilegiado de criação ideológica, onde se confrontam valores sociais contraditórios, conflitos, relações de dominação etc. Os sistemas semióticos não só exprimem a ideologia como são determinados por ela. Os signos são orientados para regular as ações sobre o psiquismo das pessoas.

A constituição do sujeito é vista como um processo de “conversão” do social no individual. A conversão se refere a um processo semiótico: descobrir/assumir uma significação nova das coisas, ou seja, consiste em transformar materialidades concretas em produções simbólicas. Para compreender a gênese da consciência é preciso analisar os processos de internalização da linguagem. O pensamento é ideológico, contém o social, pertence ao sistema ideológico social e também ao sistema psíquico.

A consciência constitui a forma como o individuo conhece o mundo num trabalho de interpretação da vida, de nós mesmos, da relação com o mundo, através do pensar, do sentir, sonhar. A emoção deve ser vista como um elemento constitutivo da consciência e como uma dimensão fundamental desta.

O processo de produção de sentidos, pode conter elementos contraditórios, que incluem emoções e afetos como prazer e desprazer, gostar e não gostar. O processo cognitivo não existe descolado da emoção. De acordo com Vigotsky, o pensamento propriamente dito é gerado pela motivação, por nossos desejos e necessidades, nossos interesses e emoções. Assim, o pensamento será concebido como pensamento emocionado, a linguagem será sempre emocionada, expressando uma avaliação do sujeito, o sentido subjetivo que determinado fato ou evento tiveram para ele.

Para González Rey, o externo só passa a ter sentido quando entra em contato com o interno. No processo constante de internalização, o social aparece configurado em termos subjetivos, a realidade aparece de outra maneira, constituída subjetivamente na forma de configuração.

O caminho de apropriação da realidade pelo individuo (subjetiva/objetiva) quando não consegue imprimir uma nova forma de agir, evidencia que este individuo vive uma situação de cisão entre o pensar, sentir e o agir, marcada pela tensão entre a possibilidade do novo e a permanência. Neste processo, a realidade social encontra múltiplas formas de ser configurada, seja sem desconstituir velhas concepções e emoções calcadas em preconceitos, seja pelas visões ideologizadas, fragmentadas, etc. esta situação pode nos ajudar a compreender esse movimento de não-transformação.

Portanto, a consciência deve ser vista como integrada e multideterminada, marcada pela processualidade constante, na qual é possível à reconstrução interna do mundo objetivo. Ela é tencionada por produtos históricos e pela subjetividade dos sujeitos, é social e ideológica, intersubjetiva e particular.


5. A PRÁTICA PROFISSIONAL

A intervenção do profissional de psicologia deve ser vista, como trabalho, ou seja, um emprego de energia de forma intencionada para produzir transformações no meio. Ao planejar essa intervenção, consideramos não só nossos conhecimentos teóricos e valores pessoais, mas as condições, necessidades, vontades e projetos da pessoa para a qual prestamos nosso serviço. Esta se torna um trabalho duplo: a intervenção do profissional que, internalizada pelo sujeito, é transformada, através de um trabalho de conversão das expressões do profissional em possibilidades individuais.

Na prática profissional em Psicologia Sócio-Histórica, a intervenção é fundamental, pois estão nele os valores e fundamentos da Psicologia. Interferimos no processo psicológico, atuamos para transformar algo no processo de registro do mundo que as pessoas fazem, para recriar sentidos e refazer projetos de vida, transformando a possibilidade de intervenção no mundo cotidiano.

Atuando na orientação profissional ou sexual, vamos construir técnicas e formas de trabalho que permitam refletir sobre o que já se construiu até esse momento da vida acerca desse assunto ou tema, introduzindo novas informações capazes de contribuir para reestruturação do que estava configurado e transformar assim o projeto do individuo de forma a permitir uma intervenção mais satisfatória no cotidiano.

Atuando na clínica, trabalhamos para romper processos de fragilização nos sujeitos. A saúde psicológica dos sujeitos está na possibilidade de enfrentar cotidianamente o mundo de modo a interferir nele, construindo soluções para dificuldades e problemas que se apresentem. Assim, interferimos na construção dos sentidos, nos registros que o sujeito fez do mundo, estes que são fontes de suas frazilizações. Isto envolve a organização psicológica do sujeito no decorrer de sua vida. Interferimos para recuperar ou romper um processo de frazilização que se apresenta como dificultador e ameaçador.

O trabalho educacional, por sua vez, antecipa qualquer frazilização do sujeito. É uma atuação que se faz para promover a capacidade de intervenção e de transformação do homem sobre o mundo cotidiano. È preciso que o sujeito seja pensado em sua inserção sociocultural e todas as suas capacidades e dificuldades sejam vistas da perspectiva histórica.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conclui-se que as proposições da Psicologia Sócio-Histórica ligadas ao conhecimento do homem e sua subjetividade evidenciam a relação dialética do homem com a natureza constituindo o seu psiquismo, e que a consciência é constituída a partir dos próprios signos, de instrumentos construídos pela cultura e pelos outros, tornando-se instrumentos internos e subjetivos da relação do individuo consigo mesmo.

A atividade consciente do homem é motivada pelo surgimento da linguagem, constituindo-se um fator essencial na formação da consciência. Ela é tencionada por produtos históricos e pela subjetividade dos sujeitos, é social e ideológica, intersubjetiva e particular.

Portanto, a prática profissional em Psicologia Sócio-Histórica é voltada para a intervenção no processo psicológico, atuando para transformação no processo de registro do mundo que as pessoas fazem, para recriar sentidos e refazer projetos de vida, transformando a possibilidade de intervenção no mundo cotidiano.

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


BOCK, A.M.B., GONÇALVES, M.GM. e FURTADO, O. – Psicologia Sócio-Histórica. São Paulo: Cortez, 2001.

Comentários

  1. socio-histórica e não sócio-histórica é a grafia correta. Ver nova ortografia e colocação de hífen. Socio, no caso, não é substantivo como associado, mas prefixo radical grego.

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